Participação ativa: deve-se levar em conta a experiência do trabalhador e aprimorar sua percepção de riscos

                                                                                                                                                          Ilustração: Beto Soares/Estúdio Boom

A nova NR 1 tem como objetivo estabelecer as diretrizes e os requisitos para o gerenciamento de riscos ocupacionais, mas não indica o “como fazer’’, podendo apresentar algumas lacunas e imperfeições técnicas. Entretanto, representa uma mudança de paradigma na gestão de SST nas organizações produtivas.

O PGR (Programa de Gerenciamento de Riscos) está inserido no sistema de gestão de saúde e segurança como um de seus subsistemas. Ele deve ser conduzido de forma dinâmica, objetiva e transparente para todas as partes interessadas. Toda organização procura minimizar seus erros identificando seus processos e buscando um desempenho compatível com suas limitações, mas de forma que estimule seus talentos a ir mais longe. É fundamental que os profissionais que atuam nessas áreas conheçam o contexto da gestão integrada da organização, ou ausência desta, onde estão trabalhando, a fim de identificar oportunidades de interações e integrações que podem ser alinhadas para a melhoria dos resultados.

Em geral, para a área de SST, esses referenciais usam a metodologia do PDCA (Plan-Do-Check- Act, ou seja, planejar, fazer, verificar e atuar). Resgatar a importância do trabalhador na participação ativa na gestão tem papel fundamental.

A Nova NR 1, em seu item 1.5.3.3, define que a organização deve adotar mecanismos para:

a) consultar os trabalhadores quanto à percepção de riscos ocupacionais, podendo para este fim ser adotadas as manifestações da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), quando houver; e

b) comunicar aos trabalhadores sobre os riscos consolidados no inventário de riscos e as medidas de prevenção do plano de ação do PGR.

MAPEAMENTO

Vamos revisitar alguns conceitos importantes a respeito da efetiva participação dos trabalhadores na avaliação e construção de sua percepção de risco. Começo pelo mapeamento de riscos ambientais, resgatando princípios importantes.

Nos anos 60 o sindicalismo italiano fez uma experiência introduzindo uma nova metodologia para a pesquisa de riscos que consistia numa avaliação pelos trabalhadores das condições reais do seu local de trabalho. O objetivo era encontrar uma forma de minimizar ou, se possível, por um fim à exposi-ção dessas pessoas a agentes agressivos. Trabalhadores de todos os níveis hierárquicos foram alertados sobre os riscos a que estavam expostos.

Em 1984, chegou ao Brasil o material didático conhecido como modelo operário italiano, que subdividia os riscos dos ambientes de trabalho em quatro grandes grupos:

  • Primeiro grupo – ruído, temperatura, iluminação, umidade e ventilação;
  • Segundo grupo – poeiras, vapores e fumaça, radiações ionizantes;
  • Terceiro grupo – carga de trabalho e cansaço físico;
  • Quarto grupo – monotonia, ritmo excessivo de trabalho, repetitividade, carga de responsabilidade, conflitos, posições incômodas etc.

O Ministério do Trabalho, através da Portaria nº 5 de 1992, alterou a NR 9 – Riscos Ambientais, introduzindo o Mapa de Riscos, que contém cinco grandes grupos: físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e mecânicos. Essa atividade deveria ser desenvolvida pela CIPA e, após sua aplicação em várias empresas, o texto sofreu melhoria por meio da Portaria nº 25 de dezembro de 94, que instituiu o PPRA e, num de seus anexos, havia a atribuição da CI-PA: “elaborar, ouvidos os trabalhadores de todos os setores do estabelecimento e com a colaboração do SESMT, quando houver, o Mapa de Risco, com base nas orientações constantes do Anexo IV, devendo o mesmo ser refeito a cada Gestão da CIPA”. As etapas de elaboração foram reformuladas e o nome dos grupos mantidos, com exceção dos riscos mecânicos que passaram a se chamar riscos de acidentes.

Desde 23 de fevereiro de 1999, quando foi publicada no Diário Oficial a Portaria nº 8, que alterou a Norma Regulamentadora 5 – CIPA, o texto do item 5.16, letra “a”, define que “a CIPA terá por atribuição, identificar os riscos do processo de trabalho e elaborar o Mapa de Riscos, com a participação do maior número de trabalhadores, com assessoria do SESMT, onde houver”. A NR 5 não mais estabelece a metodologia. Agora, sendo livre a sua escolha, a ideia é que se use uma metodologia mais avançada, com a exigência de uma participação considerável dos trabalhadores.

REALIDADE

O levantamento de riscos deve expressar a realidade dos fatos. Por isso, é fundamental ouvir o que tem a dizer o trabalhador envolvido, ou seja, aquele que está exposto aos riscos no dia a dia. Deve-se procurar tirar o máximo de informações como por exemplo:

  • Dificuldade na execução de alguma tarefa;
  • Incômodos no local de trabalho ou na execução de alguma tarefa;
  • Acidentes mais comuns;
  • Sugestões para melhoria;
  • Ideia de graduação de risco. Deve-se levar em conta a opinião de todos os funcionários envolvidos e não apenas de um pequeno grupo. O que vale é o conceito subjetivo, ou seja, a visão do grupo, possibilitando assim a troca e a divulgação de informações sobre os riscos entre os empregados, bem como estimular sua participação em medidas preventivas.

Outro aspecto importante são os cursos e capacitações envolvendo os trabalhadores. Talvez, em muitas situações, o critério adotado nas capacitações e nos cursos não levam em consideração o fato de que estamos transmitindo informações a adultos que já possuem, de certa maneira, conceitos pré-estabelecidos.

Neste caso, o formato como se está capacitando e informando o trabalhador deve ser avaliado levando em conta a sua eficácia. Nesse sentido, sugiro adotar os princípios da Andragogia, ciência que estuda as melhores práticas para orientar adultos a aprender. É preciso considerar que a experiência é a fonte mais rica para essa aprendizagem. Adultos são motivados a aprender conforme vivenciam necessidades e interesses que a aprendizagem satisfará em sua vida. O modelo andragógico se baseia nos seguintes princípios:

1. Necessidade de saber – adultos precisam saber por que precisam aprender algo e qual o ganho que terão no processo.

2. Autoconceito do aprendiz – adultos são responsáveis por suas decisões e por sua vida, portanto querem ser vistos e tratados pelos outros como capazes de se autodirigir.

3. Papel das experiências – para o adulto suas experiências são a base de seu aprendizado. As técnicas que aproveitam essa amplitude de diferenças individuais serão mais eficazes.

4. Prontidão para aprender – o adulto fica disposto a aprender quando a ocasião exige algum tipo de aprendizagem relacionada a situações reais de seu dia a dia.

5. Orientação para aprendizagem  o adulto aprende melhor quando os conceitos apresentados estão contextualizados para alguma aplicação e utilidade.

6. Motivação – adultos são mais motivados a aprender por valores intrínsecos: autoestima, qualidade de vida, desenvolvimento.

Em resumo, as capacitações devem adotar informações aplicadas nas tarefas “situações” dos trabalhadores, construindo de maneira robusta uma percepção de risco em suas atividades. Conheça sua realidade, cultive formas de prevenção, veja o que já deu certo e mantenha, criando de tempos em tempos os ajustes necessários.

Revista Proteção, por Jorge Chahoud, engenheiro de Segurança do Trabalho e Ambiental,

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